ITAGIBÁ EM FOCO: ONG estima que 85 mil crianças morreram de fome e doenças em guerra no Iêmen

quinta-feira, 13 de junho de 2019

ONG estima que 85 mil crianças morreram de fome e doenças em guerra no Iêmen


HODEIDA — A ONG Save the Children estima que quase 85 mil crianças com menos de 5 anos morreram de fome e doenças desde o início da guerra no Iêmen, em 2015. A organização alerta que, se o conflito não for encerrado em breve, 14 milhões de pessoas correm o risco de grave carência de alimentação. Segundo a ONG, pelo menos 84.700 crianças menores de 5 anos padeceram sob suspeita de má nutrição entre abril de 2015 e outubro deste ano — o equivalente a toda a população infantil de Birmingham, a segunda maior cidade britânica.

Segundo moradores, em Hodeida, atual linha de frente do confronto entre rebeldes houthis e tropas do governo iemenita apoiadas pela coalizão liderada pela Arábia Saudita, o preço dos alimentos subiu pelo menos 400%. Apenas dois hospitais funcionam na cidade portuária, com acesso dificultado pela proximidade dos confrontos e bombardeios.

"Para cada criança morta por bombas e balas, dezenas morrem de fome, e isso é inteiramente possível de prevenir", destacou o diretor da Save the Children para o Iêmen, Tamer Kirolos. "Por conta dos confrontos, os pais demoram a levar as crianças para tratamento de má nutrição, quando seus órgãos internos não funcionam, e elas têm múltiplas infecções provocadas pela fraqueza."

Segundo Kirolos, quando a desnutrição chega a esse ponto há pouco que os médicos possam fazer para salvar as crianças. A ONG alerta que o número de casos aumentou desde que a coalizão saudita impôs um bloqueio de um mês ao país empobrecido, há um ano.

Em 15 de novembro, o pai Saleh al-Faqeh segurava as mãos da filha de 4 meses, Hajar, quando ela dava os últimos suspiros no principal hospital de Sanaa. Ela havia sido levada na semana anterior ao centro al-Sabeen com grave má nutrição. A família, moradora do reduto houthi de Saada, não conseguiu recuperar a pequena em dois meses de internação no hospital local e decidiu transferi-la à capital, em jornada perigosa por estradas frequentemente bombardeadas pela coalizão saudita.

Fouad al-Reme, enfermeira do al-Sabeen, recordou que Hajar chegou consciente ao hospital, mas sofreu com baixos níveis de oxigênio. "Ela era pele e osso, seu corpo estava enfraquecido", lamentou a profissional.

A aliança pró-saudita lançou bombardeios em 2015 contra os rebeldes houthis, apoiados pelo rival Irã, que haviam tomado o controle do país e forçado o presidente Abed Rabbo Mansour Hadi a fugir e se exilar em Riad. Desde então, as batalhas levaram o país à crise humanitária e o fizeram sucumbir à fome. Os bombardeios mataram centenas de pessoas, embora as forças lideradas pelos sauditas digam não mirar em civis.

Aliados ocidentais, incluindo os Estados Unidos, apelaram por um cessar-fogo diante de novos esforços de paz da ONU. O cenário acompanha ainda a crescente reserva de governos sobre o conflito desde o assassinato do jornalista Jamal Khashoggi no consulado saudita de Istambul, por ordens de altos funcionários de Riad. O enviado das Nações Unidas para o conflito no Iêmen, Martin Griffiths, chegou à capital Sanaa nesta quarta-feira para relançar as negociações de paz. A ideia é organizar reuniões na Suécia.

Mais de dois terços da população hoje dependem de ajuda humanitária para sobreviver no Iêmen. Segundo a ONU, 400 mil crianças correm risco de morrer de fome - 15 mil a mais que a previsão do ano passado. Nos últimos cinco meses, o conflito se intensificou com a incursão das forças iemenitas e sauditas para cercar Hodeidah, lar de 300 mil pessoas. Representante do Unicef no país, Meritxell Relano destacou em setembro que 80% da população iemenita de menos de 18 anos estão vulneráveis a escassez de comida, doenças e falta de acesso a serviços sociais básicos.

Pelo menos 80% da comida e dos suprimentos médicos do Iêmen chegam pela cidade portuária. Mas as importações comerciais despencaram em meio às batalhas. Neste momento, os mantimentos que entram no país só atendem a 16% da população, segundo a Save The Children.

Declarações públicas de houthis e forças governamentais deram esperança de cessar-fogo e abertura à ajuda humanitária no começo da semana. O governo iemenita destacou na segunda-feira que participaria das negociações de paz da ONU, marcadas para o próximo mês. Horas antes, o represente dos rebeldes Mohammed Ali al-Houthi havia anunciado a suspensão de operações militares.

No mesmo dia, o Reino Unido apresentou um projeto de resolução ao Conselho de Segurança da ONU, no qual pede uma trégua imediata em Hodeida e dá às tropas o prazo de duas semanas para eliminar todas as barreiras à ajuda humanitária na região, segundo texto obtido pela AFP. Apesar dos apelos por paz, combates violentos irromperam horas depois em Hodeida. Os rebeldes lançaram fogo, e as forças pró-governo responderam com ataques.

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